terça-feira, 5 de abril de 2011

Frost - Smile Now, Die Later (East Los Angeles, LA, Califórnia, EUA. 1995)


Se viéssemos a escolher um personagem forte, icônico, que representasse e sintetizasse toda a cena Chicana do rap em suas músicas, a minha escolha seria curta e direta: Frost, ou Kid Frost, como é conhecido. Tal escolha passa por inúmeros fatores, que iriam desde sua voz rouca e sua levada tranquila, até às letras e temáticas trabalhadas em seus álbuns. A escolha também consideraria elementos fundamentais, tais quais a tradição (tempo de estrada) no cenário. E é certo que um dos motivos desta escolha, passa diretamente por este álbum, que considero parte integrante e definitiva na lista dos 10 melhores discos de rap, de todos os tempos: Smile Now, Die Later (Sorria Agora, Morra Depois), lançado no mágico ano de 1995. Se eu fosse escrever um livro contando a história do rap norte-americano, precisaria escrever outro descrevendo apenas o ano de 1995 e seus desdobramentos pelos anos seguintes. Se eu fosse escrever sobre a cena chicana, precisaria escrever sobre Frost.

Arturo Molina Jr. nasceu no dia 31 de maio de 1964, na região de East Los Angeles (zona leste de Los Angeles). Cresceu em meio àquela comunidade, cuja predominância de mexicanos e latinos é gigantesca, tendo iniciado seus primeiros contatos com a música, ainda em 1982. Naquela época, adotou pra si a alcunha de Kid Frost (Piá Congelado), uma homenagem ao rapper Ice-T, dono de músicas como "Cold Rap" (Rap Frio), com quem ele havia feito batalhas de rimas. Não demorou para que Kid Frost viesse a crescer no cenário underground do rap, conseguindo assinar contrato com a poderosa Virgin Records, que viu nele uma oportunidade de ouro, já no final da década de 80. Desta forma, Kid Frost lança seu primeiro single, um hit instantâneo, intitulado "La Raza". A música viria a fazer parte de seu primeiro disco, que seria lançado pela Virgin Records em 1990, chamado Hispanic Causing Panic (Hispânico Causando Pânico), e o videoclipe da música La Raza estreou em canais especializados de música, tais quais a MTV, sendo um verdadeiro marco para os latinos, ao mostrar o cotidiano dos Éses na região de East Los Angeles, abaixo do sol, nos murais, nas ruas, e nas barcas de Impala. Já em 1991, Frost formou um super-grupo, formado por ele, Kid Frost, A.L.T., Lighter Shade of Brown e Mellow Man Ace. Todos estes eram os grandes nomes da cena Chicana, e o super-grupo, chamado Latin Alliance (Aliança Latina), lançou um álbum, de mesmo nome, ainda naquele ano.

Kid Frost já estava com o nome muito bem consolidado na cena musical, e lançou outro disco, pela Virgin Records, chamado East Side Story (História da Zona Leste). Este trabalho, que será futuramente analisado por este blog, já nos mostrava um Kid Frost mais profundo, adentrando com maior intensidade nas questões sociais do povo latino, bem como retratando fielmente a paisagem gangster de uma East Los Angeles de gangues latinas, criminalidade, confrontos com a polícia, fugas, entre outros. O disco, que contava com a participação de Ganxta Ridd (Boo-Yaa T.R.I.B.E) e MC Eiht, foi outro grande marco na carreira de Kid Frost, sendo uma das grandes pérolas do rap chicano da década de 90. Porém, o melhor ainda estaria por vir.

Já a partir de meados de 1994, Kid Frost se aproxima de Eazy-E, o patrão da cena Gangsta, que já estava trabalhando outros talentos chicanos, tais quais o Brownside, A.L.T, além de ter dado a Julio G e Tony G, um show de rádio da Ruthless Records, fora a oportunidade de ambos produzirem instrumentais para alguns rappers da gravadora. Não se sabe ao certo, mas pode ser que Kid Frost tenha se juntado ao Eazy-E através de A.L.T, seu grande parceiro de músicas. Toker do Brownside, certa vez, havia dito sobre o quanto Eazy-E tinha interesse na cena musical latina, naquela época. Isto posto, a ida para a Ruthless Records foi o momento certo para um maior amadurecimento de Kid Frost enquanto rapper, letrista, e músico. Com o falecimento de Eric Wright, a Ruthless Records sofre mudanças no seu quadro de artistas, e Kid Frost não é afetado. Continuou trabalhando no desenvolvimento de seu álbum, Smile Now, Die Later; ao lado de Julio G, Tony G e Cold 187um (Above The Law). Foi quando no dia 3 de outubro de 1995, o disco chegou às lojas. E eternizou-se, como um dos maiores trabalhos do rap chicano já vistos. Em Smile Now, Die Later; podemos presenciar um Frost muito mais maduro em relação aos seus trabalhos anteriores. A começar pelo nome, sem o "Kid", mostrando que não se tratava mais de um jovem, mas sim, de um homem formado. O álbum segue à risca seu título (Sorria Agora, Morra Depois), e podemos dividí-lo numa exata metade, com 6 músicas falando de momentos bons, rolês, família, amigos e irmãos; e outras 6 músicas mais obscuras, falando da realidade das ruas, atividades de gangue, perdas de entes queridos, entre outras questões. O bordão utilizado para nomear o disco, vem de uma tradicional frase latina, usada em tatuagens naquela época: Smile Now, Cry Later (Sorria Agora, Chore Depois), uma espécie de "Carpe Diem" (Aproveite o Dia) das ruas de Los Angeles. Vale lembrar, que naquele tempo, tatuagem era realmente coisa séria. Logo, o acrônimo do álbum trabalha esta questão, no sentido de que você deve aproveitar os momentos, esquecendo da morte, deixando ela para depois.

Com produções extremamente G-Funk's, o Smile Now Die Later é uma obra-prima das ruas de East Los Angeles. Seu encarte mostra toda a arte latina dos desenhos, a antiga arte das tatuagens à velha escola, elaborada por Toons & Abel, com direção de arte do próprio Frost. Começa com a épica e clássica East Side Rendezvous, um single poderoso, que contava com um excelente videoclipe, que mostrava com exatidão, como era a vida na região de East Los Angeles. Com participação de A.L.T e O.G.Enius, e a voz marcante de Diane Gordon nos refrões, a East Side Rendezvous é um tipo de música que merece destaque especial. Uma análise à parte. Com uma letra até simples, mas de puro impacto no coração, Frost fala sobre coisas puras, como o fato de agradecer a Deus por acordar numa finalmente sexta-feira, sobre o sol, a noite, as mulheres. Uma presença épica, de espírito, e de fotografia, devidamente notada no videoclipe. O jogo de imagens, que passam desde o corpo da mulher latina de biquini na beira da piscina, ao Impala lowrider passando pelas ruas de East Los Angeles, com um instrumental G-Funk fantástico, e uma letra que fala sobre a vida, no melhor sentido da cena, é de marcar a alma. Um puro impacto, firme, que estabeleceu a Ruthless Records, a cena Chicana, Frost, A.L.T, O.G.Enius, como donos de uma gangsteria que realmente ultrapassava a própria poesia em sí.

Em La Família, com Rich Garcia nos backing vocals, Frost traz à tona mais um clássico da velha-escola, com um instrumental no melhor estilo do final dos anos 80, falando sobre o fato dos mexicanos serem todos uma verdadeira família. Gente que se defende, Éses que se defendem. Em You Ain't Right, presenciamos mais do blues no formato G-Funk, onde Frost descreve todo o processo que o transformou num homem, desde a sua infância em um bairro violento, até o fato de ter ultrapassado todas estas limitações, tornando-se um adulto, com direito à scratches de um trecho de um som de BG Knocc Out. Em "Mari", a quarta música, Frost chama Rick James, um cantor de Funk & Soul que fez muito sucesso ao cantar o ode à marijuana, chamada "Mary Jane". Esta faixa é a regravação deste hit, e ficou excelente, moderna, com a pegada clássica daqueles funkadélicos anos 90. Menções que valem ser destacadas, além de toda a qualidade do disco, são as músicas Last Days, com participação do Above The Law, La Raza II, Rest In Peace, por onde Frost & Kokane fazem suas homenagens àqueles que se foram, por conta da violência do dia a dia; Bamseyaa, que conta com uma produção bem Mariachi; e Look At What I See, outro single carro-chefe do álbum, que conta com a participação de A.L.T.

Chegando à posição de número 36 no chart dos Top R&B/Hip-Hop, o disco teve boas vendas, o que consolidou por definitivo o nome de Frost como o "Godfather" do rap chicano. Vale a pena, para quem busca a melhor síntese da cena chicana, já lançada. Para quem quiser curtir um trabalho muito bem feito, que consegue trabalhar cada elemento urbano da ensolarada califórnia, através do viés latino.

Eternizadas: East Side Rendezvous

Menções honrosas: O disco todo!

01. East Side Rendezvous (feat. A.L.T., O.G.Enius & Diane Gordon)
02. La Familia (feat. Rich Garcia)
03. You Ain't Right
04. Mari (feat. Rick James)
05. Nothing But Love for the Neighborhood (feat. Rich Garcia)
06. Rest in Peace (feat. Rich Garcia)
07. La Raza II
08. Bamseeya
09. Look at What I See (feat. A.L.T.)
10. How Many Ways Can You Lose a Body (feat. A.L.T.& O.G.Enius)
11. Last Days (feat. Above the Law & Kokane)
12. Youseemurda


GEAH!
http://www.4shared.com/file/BOoPgoxz/Frost_-_Smile_Now_Die_Later__1.html